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W965p Waelder, O pensamento vivo de Freud




index do verbete

B INTRODUÇÃO À OBRA DE FREUD.

1 As origens da psicanálise (abr.: ´p).

1 Freud dedicou-se à anatomia e fisiologia do sistema nervoso central. Interessou-se pelo hipnotismo. Estudou hipnotismo com Charcot

1.a origem psíquica da enfermidade mental


2 Primeira descoberta: a concepção da origem psíquica da enfermidade mental. Essa idéia colidia totalmente com a dominante na época, era revolucionária. A ciência médica do séc. xix era materialista, concentrada na física e na química. Cria-se que as doenças mentais eram doenças do cérebro. A psiquiatria deixava de fora a psique.

1.b concepção de uma vida inconsciente


3 Freud chegou à concepção de uma vida inconsciente, estudando o fenômeno da sugestão pós-hipnótica. Uma ordem dada ao hipnotizado para ser executada depois de acordar era, mais tarde, executada. Perguntado porque o fez, o ex-hipnotizado, que não se lembrava do ocorrido durante o transe, criava uma racionalização para explicar os motivos. A cobaia crê sinceramente que os motivos alegados são verdadeiros, e desconhece o verdadeiro motivo, a ordem dada durante o transe. O sentido disso é imenso: demonstra que as razões dos nossos atos podem ser diferentes daquilo que cremos ser a verdadeira razão, porque sofremos a influência de forças puramente psíquicas a respeito das quais nada sabemos. Ou seja, a experiência prova a existência de forças inconscientes na psique.

1.c Método catártico. Catarse e abreação


4 Breuer relatou caso de paciente em quadro de paralisia. Consciente ela não sabia explicar o surgimento de seus sintomas nem relaciona-los com experiências de sua vida. Hipnotizada, revelava imediatamente o elo intermediário. Seus sintomas se ligavam a fatos reais: em várias ocasiões ela teve de reprimir pensamentos ou impulsos enquanto tratava do pai doente. O sintoma era um substituto do conteúdo recalcado. Quando, sob hipnose, se lembrava de uma situação similar, e completava de forma alucinatória o ato mental que tinha reprimido/suprimido, o sintoma desaparecia para não mais voltar.

5 Até então a hipnotismo era usada para sugestionar os pacientes contra seus sintomas. Freud passou a usar a hipnotismo para investigar os fatos causadores do sintoma. Concluiu que os sintomas histéricos eram resíduos de situações traumáticas que não tiveram solução satisfatória. As reações afetivas ligadas a essas situações estavam inibidas, porque não foram descarregadas. Lembradas as situações durante a hipnotismo os processos afetivos surgiam e eram descarregados. Freud chamou isso de abreagir. O tratamento visava a catarse (catharsis), uma purificação.

1.d Método psicanalítico.


6 Depois Freud se convenceu a abandonar o hipnotismo e desenvolveu outro método, aplicável ao paciente consciente. Em vez de interrogar os pacientes sobre as origens dos sintomas, deixava-os falar livremente.

7 A descoberta do continente negro da vida inconsciente. A psicanálise procura exercer controle sobre o inconsciente, investigando-o, para torna-lo consciente. Onde houver o [Id], haverá o Ego (p. 178).

2 Concepções básicas da psicanálise.


8 Espírito e estado consciente não são coisas idênticas. Os conteúdos inconscientes do espírito têm caráter similar aos do consciente: pensamentos, desejos, temores, esperanças.

9 A menos que os conteúdos inconscientes sejam considerados, a vida do espírito carece de sentido.

10 A vida mental é cheia de conflitos. O conflito com o mundo exterior é só um dos aspectos. Há abundância de contradições internas, tensão entre fatores internos. Esses fatores são o id, vida instintiva, ego, parte organizada da personalidade, e o superego, a consciência.

11 Antes da psicanálise a psicologia era só do ego.

12 Os instintos do id são o sexual e o agressivo. Sexual não se refere só à procriação, mas num sentido mais amplo de sensualidade, como concupiscência ou o sentido vulgar do verbo amar. A agressão compreende os impulsos de ódio, hostilidade, destruição.

13 Só um ego forte é capaz de permitir a satisfação dos instintos compatíveis com uma adaptação social adequada e aprovados pela consciência do homem maduro, e negar satisfação a tudo o mais, pois o preço disso é o desconforto.

14 Métodos defensivos como o recalque relaxam as tensões internas mas não resolvem o problema e geram complicações. Recalque: recusa a reconhecer a exigência do instinto, mandando-o para o inconsciente, onde mantém sua força e, como foi subtraído da influência do ego, dirige sua própria vida: o ego fica privado de controle (p. 162).

15 Recalque não é sinônimo de inibição. (?)

16 Os impulsos recalcados não foram privados de poder e voltam em formas veladas, nos sintomas neuróticos.

17 Na raiz de uma neurose está sempre um conflito do impulso sexual — no sentido amplo. Tais impulsos são difíceis de serem domesticados. A natureza, para garantir suas finalidades, criou um excesso de energia nesse ponto.

18 A sexualidade amadurece na adolescência, mas os impulsos sexuais são congênitos, embora, durante a infância, não mostrem todos os característicos da sexualidade plena. Mas apresentam os que, em conjunto, dão a noção geral de sexualidade: o prazer físico como fim, a excitação e o apetite.

19 As neuroses se originam na infância, principalmente entre 3 e 6 anos: o ego infantil está ainda pouco desenvolvido e é incapaz de resolver seus conflitos adequadamente, recorrendo aos métodos defensivos mais elementares. O ego maduro do adulto normal consegue resolver seus conflitos sem adoecer, mas continua incorrendo nos conflitos em que já incorreu na infância.

20 ‘Fantasmas do passado vagueiam à luz do dia. É como se o homem trouxesse a seu lado a sua infância, como um mundo pessoal e invisível que projetasse a sua sombra no mundo da realidade. A nossa reação ao mundo exterior é, em parte, determinada por esses fantasmas’ (p. 164).

21 A psicanálise cura com ajuda das interpretações. Objetiva abolir os recalques, tornar consciente o inconsciente e dar ao ego maduro oportunidade de resolver novamente os conflitos do passado. ‘O passado é assim relembrado e privado de seu poder, por ser impelido para o tempo a que ele pertence’ (§ 164).

22 Freud evocou o aqueronte, as regiões inferiores da alma, especialmente os ‘aspectos noturnos’ da vida do homem. O receio de contaminar os outros, que o sifilítico manifesta, é na realidade o seu desejo de os contaminar, para que sejam excluídos como ele. No caso da sentença de Salomão para o bebê disputado entre duas mulheres, a mãe simulada, a que perdeu, pode ser reconhecida pela expressão do seu ódio: se ela perdeu o filho, a outra também não deve possuir um filho vivo.

23 ‘A natureza humana ultrapassa muito, quanto ao bem e ao mal, o que o homem acredita a respeito de si mesmo’ (p. 167).

24 A história da espécie humana é a de um lento despertar da consciência a partir de uma existência instintiva. Nossos ancestrais eram impulsionados quase que exclusivamente pelos instintos, paixões e medos. As primeiras inibições vieram de tabus primitivos. Durante um curso de extenso desenvolvimento o intelecto humano obteve alguma coisa em suas relações com os elementos do espírito. O que lucrou foi insignificante, mas pode facilmente submergir de novo. Houve uma espécie de cerebração progressiva no progresso humano (p. 178-9).

C CONCEITOS BÁSICOS DA PSICANÁLISE. UM DIÁLOGO.


25 ‘No confessionário o pecador conta o que sabe; na análise, porém, espera-se que o neurótico revele muito mais’ (p. 190).

26 ‘Considerando que toda a gente tem uma vida psíquica, toda a gente se considera, por isso, psicólogo nato’ (p. 194). Como aquela senhora que dizia que sabia cuidar de crianças, porque ela própria tinha sido criança.

3 O ego


27 O ego: uma organização psíquica, registrando sensações e percepções de necessidades físicas por um lado e suscitando ações motoras por outro lado.

28 O ego serve de primeiro plano ao id, é seu exterior ou vergôntea (ramo fino de árvore ou arbusto; rebento, broto; H.). É o id, modificado de acordo com a influência que o mundo exterior exerce sobre ele (p. 198).

29 O ego está intercalado entre o mundo exterior e o id, que é o núcleo da vida psíquica. Enquanto o id não sofre conflitos, o ego não pode escapar a eles, e seu único meio de sair do dilema é renunciar a um impulso em benefício de outro.

30 O ego é controlado pela tendência à unificação, à integração. Cabe a ele mediar e conciliar as tensões entre o mundo externo e o as exigências do id, escolhendo quando é oportuno satisfazer o instinto e quando é preciso adiar a satisfação, ou modifica-la, substituindo a satisfação por uma compensação.

31 ‘o discernimento suficiente para perceber quando é oportuno sufocar as paixões, ou quando se deve enfrentar e combater as realidades do mundo exterior é, finalmente, o Alfa e o Ômega da sabedoria prática’ (p. 202-3).

32 A suprema realização do ego é mudar as condições exteriores para torná-las favoráveis à satisfação dos desejos.

33 Um ser primitivo que busca satisfação cega das suas tendências normalmente é aniquilado. A evolução do ego é um passo para conservação da vida.

4 O id


34 Id é o núcleo da vida psíquica. Nunca é assaltado por conflitos (p. 198). Impulsos contraditórios ali convivem sem perturbação. Sua característica é fragmentar-se em diversos objetivos independentes.

35 É preenchido por impulsos instintivos: as necessidades do nosso corpo que estimulam o espírito à ação. As necessidades do id tendem sempre para o imediato, para a satisfação urgente.

36 Princípio do prazer: satisfeito o impulso instintivo, o consciente experimenta sensação agradável. intensificação dos impulsos instintivos causa descontentamento.

37 Princípio da realidade: luta também pelo princípio do prazer, mas considera as necessidades práticas do mundo exterior que se opõe à realização dos instintos do id, e busca a conciliação entre o id e o mundo exterior.

5 O superego


38 O Superego: Dentro do mesmo ego se separou uma instância especial, a que damos o nome de "Superego".

39 Esse superego goza de uma situação especial entre o ego e o id. Esse superego pertence ao ego, participando de sua elevada organização psicológica, mas, por outro lado, mantém relações muito íntimas com o id. O superego é, na realidade, o registro das primeiras impressões, segundo foram recebidas pelo id; é o herdeiro do já desaparecido Complexo de Édipo.

40 Este superego pode opor-se ao ego e atuar contra ele como se fosse um inferior seu e, em geral, trata-o com severidade. Para o ego é tão importante manter a harmonia com o superego como com o id. As dissenções entre o superego e o ego têm uma extraordinária importância para a vida anímica. O superego é o agente do fenômeno que designamos por consciência. O superego do neurótico se mostra ainda com o ego como o severo pai com o filho e a sua moralidade atua de um modo primitivo, fazendo com que o ego se deixe castigar pelo superego. A moléstia é usada como meio desse "autocastigo" e o neurótico se vê forçado a conduzir-se como se o dominasse um sentimento de culpabilidade, que exigisse, para sua satisfação, a enfermidade como castigo. (225-226)

6 O recalque:


41 O ego, especialmente a fraco ego infantil, sente o perigo que nem de uma exigência do id como um perigo do mundo exterior, e reage da mesma forma, fugindo (de si mesmo). O ego é que se prejudicava: restringe seu próprio domínio. O impulso reprimido fica entregue a si mesmo e não pode mais ser influenciado. Parte do id permanece terreno proibido ao ego.

42 O impulso isolado não fica ocioso, em todo caso. Justamente porque a satisfação normal lhe foi negada e ele trata de compensar a si mesmo, engendrando derivados psíquicos, que tomam o seu lugar juntamente com outras reações psíquicas, alienando-se do ego. Finalmente, na forma de um substituto reconhecível, o impulso isolado penetra até o ego e o estado consciente, apresentando-se como aquilo que denominamos: "sintoma".

7 A neurose


43 Vingança do id em relação ao ego resulta em nada menos do que uma neurose. (pág. 205 - 3) (...)

44 Imposto contra o ego, porque este insistia em manter o seu estado de docilidade com relação a um mundo exterior. O conflito é, na realidade, entre id e o mundo exterior. Contudo, o ego, por ser leal e sincero, tomando o partido do mundo exterior, é levado nesse conflito do id com o mundo exterior.

45 Os impulsos recalcados são eternos porque o id não conhece o tempo (vide p.257). Somente ser reconhecidos com pertencentes ao passado, (...) despojados de sua carga de energia, depois que foram feitos conscientes pelo trabalho da análise.

46 O ego usa o recalque quando não está amadurecido – isto é, na infância.

8 Função da psicanálise


47 A psicanálise busca repor o ego na soberania sobre o id, que perdera ao fugir dos conflitos na infância (206).

48 Seu objeto é fortificar o ego, fazê-lo mais independente do superego, alargar o seu campo de visão e estender, assim, a sua organização para que possa assimilar novas partes do id. Onde estava o id deverá estar o ego. (p.263)

49 Psicologia da profundidade = Psicologia do inconsciente.

9 Resistência


50 A espécie humana nunca vive completamente no presente: as ideologias do superego perpetuam o passado, as tradições da raça e do povo. (...)

51 Toda a teoria psicanalítica está, reconstruída na percepção da resistência exercida pelo paciente, ao tentarmos fazê-lo consciente do seu inconsciente. (p.255)

52 As comunicações de idéias de um enfermo não são senão deformações daquilo que se procura desenterrar, alusões de onde o sr. deve adivinhar o que se oculta nelas. Em uma palavra: as informações fornecidas pelo paciente, sejam recordações, idéias ou sonhos, precisam primeiro ser interpretadas. (221)

53 Na arte interpretativa da análise, há qualquer coisa que deve ser estudada: tudo o que se refere à singular representação indireta por meio de símbolos.(222)

54 O enfermo quer recuperar a saúde, mas, ao mesmo tempo, não o quer. O seu ego perdeu a unidade, dessa maneira, não chega a construir volições unitárias. Se assim não fosse, o nosso paciente não seria neurótico. (223)

55 Motivos da resistência:

56 E b) Enquanto o a "vantagem da enfermidade" até é a fonte de uma de tais resistências, o "sentimento de culpabilidade inconsciente" representa a resistência do superego, o fator mais poderoso e o mais temido por nós. (226)

57 C) Quando o ego ainda fraco, foi induzido, por um medo inevitável, a um recalque, esse medo persiste sempre e se exterioriza em forma de resistência, ao se tratar de aproximar o ego do que está recalcado. (226)

10 Complexo de Édipo


58 As tendências sexuais influem sobre a vida desde o berço, e representam papel essencial na gênese dos distúrbios psíquicos.

59 O processo de desenvolvimento da sexualidade não é suave e está sujeito a obstáculos que geram fixações nas primeiras etapas. Na vida adulta, sempre que as funções sexuais forem bloqueadas de alguma forma, a libido se moverá em direção a essas fixações remotas (211).

60 O desenvolvimento da sexualidade se completa nos primeiros 5 anos. Depois período de latência, onde se desenvolvem as concepções egóicas de pudor, aversão, moralidade, destinadas a suportar mais tarde a tempestade da puberdade.

61 O menino tem medo de ser devorado ou castrado pelo pai. Isso evoca os mitos como o de Cronos que devorou seus filhos, depois de castrar seu pai Urano, e antes de ser castrado por seu filho Zeus, que só foi salvo disso pela astúcia da mãe. O lobo comedor de crianças nos contos de fadas é uma figura paterna que evoca aqueles mitos.

62 A criança, no seu desenvolvimento espiritual, recapitula a evolução da sua espécie, tal como ocorre no seu desenvolvimento físico.

63 Características da vida sexual primitiva.

64 O sexo feminino propriamente não representa nada. (...) Todo o interesse orienta-se para o órgão masculino. (213)

65 E o fato dos excrementos eliminados do seu corpo lhe despertarem um interesse de natureza sexual.

66 Os desejos sexuais infantis sempre se dirigem às pessoas mais intimamente ligadas a elas.

67 O pai ou a mãe em torno do qual não gravitam as tendências sexuais da criança passa a ser considerado o rival perturbador. Complexo de Édipo.

68 A criança deseja aquilo que concebemos por satisfação sexual, embora, naturalmente, dentro do limite da compreensão infantil. (214)

69 Parece que a sexualidade infantil é irrestrita entre os povos pouco civilizados e na camada mais baixa dos povos civilizados. Essa tolerância importa numa forte proteção contra a possibilidade de neuroses que aparecem posteriormente no adulto, mas ocasionam também uma extraordinária perda de capacidade para rendimentos de ordem social. (219)

D OS SONHOS

11 Interpretação dos sonhos.


70 O sonho manifesto (o texto do sonho) esconde um sonho latente que tem de ser descoberto. O sonho latente surgir primeira na vida mental do indivíduo.

71 Quase todo sonho contém (ou se liga a) um resíduo do acontecimento do dia anterior (vide âncora 1).

72 A interpretação dos sonhos não se baseia no texto do sonho mas nas associações que o indivíduo faz das imagens do sonho com lembranças suas. O sonho parece ser um extrato abreviado das associações. Seus elementos são como representantes de uma legião, eleitos por voto. (231)

73 As associações com o sonho não são os pensamentos latentes do sonho. Estes estão contidos, mas não completamente, nas associações. (231)

74 A interpretação dos sonhos, cuja finalidade é investigar o sonho manifesto até atingir os pensamentos latentes do sonho. (236)

75 As associações são “pistas” e cessam pouco antes de atingir os próprios pensamentos do sonho.

76 Certos elementos têm significado permanente e são os símbolos.

77 O trabalho de interpretar se realiza em face da resistência. (232)

78 Muitas vezes acontece que uma parte dos sonhos se perde, pois é eventualmente agregada a um pensamento posterior. Deve-se encarar isso como uma tentativa para esquecer essa parte, especial do sonho. A prática nos mostra que é justamente este fragmento de sonho esquecido o mais importante. (233)

79 A resistência denota conflito entre uma força que quer exprimir algo e outra que quer evitá-lo. O sonho manifesto é a solução de compromisso entre elas. A força comunicativa pode dizer o que quer, mas a mensagem é enfraquecida e deformada pelo censor do sonho, o superego.

80 O mecanismo de censura dos sonhos é o mesmo da resistência dos recalques (vide p.243).

12 Função do sonho


81 O sonho é um produto patológico, similar aos sintomas histéricos, a obsessão e a ilusão. A diferença é que o sonho é transitório. O sonho é uma psicose inofensiva. O sono é saída do mundo externo real e assim oferece a condição necessária ao desenvolvimento de uma psicose.

82 Nas psicoses a evasão da realidade é realizada de duas maneiras; ou porque o inconsciente recalcado é mais forte, de sorte que passa a governar o consciente, o qual tenta apegar-se à realidade; ou então porque a realidade tornou-se tão insuportável e penosa que o ego ameaçado, num gesto desesperado de oposição, se atira por si mesmo no seio dos impulsos inconscientes. (235)

83 No sono muda a distribuição das energias psíquicas. O inconsciente fica livre e usa a passagem aberta para a satisfação alucinatória. No sono há regressão: as formas de atividade mais antigas e primitivas podem se manifestar. Regressão arcaica do aparelho mental.

84 Em cada sonho um desejo instintivo se exibe como realizado. Como qualquer outro impulso instintivo, não pode fazer outra coisa a não ser procurar sua própria satisfação. (238)

85 Impulsos recalcados e insatisfeitos, estão prontos para agarrar qualquer oportunidade de se pronunciarem.

13 Operação do sonho.


86 Processo pelo qual os pensamentos latentes do sonho são transformados em sonho manifesto.

87 Os processos do nosso sistema mental inconsciente não são intelectuais, parecem falhos e absurdos ao consciente, trabalham na formação dos sintomas neuróticos e na operação do sonho.

88 Muitos dos pensamentos latentes reconhecidos no texto do sonho são identificados pelo indivíduo: pertencem ao consciente. Outros o indivíduo rejeita, repudia: esse é o impulso inconsciente, o criador real do sonho, que forneceu a energia psíquica necessária à formação do sonho.

89 (âncora 1) O ego só permite o sonho porque ele tem uma função prática, dar vazão a estimulantes internos e externos (resíduos do dia anterior, conscientes), que perturbam o repouso visado pelo sono. O sonho é uma válvula de escape dessa pressão. Os impulsos inconscientes se aproveitam e “pegam carona”. O sonho, assim, é por si uma formação adaptada (vide resumo p.238). O impulso recalcado tem de se disfarçar, associando-se de alguma forma aos excitantes que o sonho deve aliviar. O impulso vai “de contrabando”.

90 Por causa da regressão, o impulso não dispõe da linguagem completa para expressar. Falta a gramática. Muitos dos recursos mais sofisticados da expressão consciente estão desligados. Para expressar o abstrato e sonho tem de empregar o concreto de que aquele se originou. Acaba usando símbolos que são arcaicos e se tornaram estranhos ao pensamentos consciente.

91 O sonho escolhe imagens que podem condensar mais de um pensamento.

92 Transferência de acentuação afetiva. As idéias, no sonho, são separadas do seu componente afetivo. A acentuação (vividez das imagens no sonho manifesto) é transferida para idéias sem importância. Mecanismo para camuflar as idéias importantes, ou efeito da censura.

93 Elaboração secundária. O sonho entra no consciente como objeto da percepção, e é tratado pelo consciente como qualquer conteúdo da percepção. O consciente tenta preencher as lacunas através de raciocínio e acaba contaminando o sonho. Todo sonho é a realização, ou a tentativa de realizar (satisfazer) um desejo.

94 (âncora 2) As exigências instintivas do id são de natureza erótica ou agressiva.

14 Tipos de sonho


95 Sonhos de desejo, sonhos angustiosos e sonhos punitivos.

96 Sonhos punitivos são também desejos que se realizam, mas não os desejos do id, e sim os do superego. É uma réplica do superego a um desejo do id.

97 Sonhos angustiosos: causas.

98 O trabalho do sonho falha: não consegue propiciar a satisfação do impulso, o que causa angústia. Sonhar que bebe água não mata a sede.

99 A satisfação do desejo não propicia prazer, mas angústia, porque o indivíduo rejeita, censura seus desejos, não quer saber deles. A angústia é um substituto ou manifestação da censura.

E ANATOMIA DO ESPÍRITO.


100 O recalcado é um território estrangeiro para o ego, uma espécie de território estrangeiro interno. Os homens adoecem devido ao conflito que se estabelece entre as exigências dos seus instintos e a resistência interior, que se levantou contra elas. (247)

101 O ego pode tomar o papel de objeto, tratar a si mesmo como qualquer outro objeto novo, observar-se, criticar-se a si mesmo. (...) Em tal caso uma parte do ego se levanta contra outra. O ego pode, então, partir-se, fender-se. Não há nada que desliguemos do nosso ego tão frequentemente como a nossa consciência e nem nada tão fácil de contrapor-lhe. (248-9)

102 Compreender a personalidade normal estudando a patológica, que revela fendas que indicam elos (cristal – quebra – clivagem) A síndrome da ilusão de observação levou à idéia do superego.

103 Ataque de melancolia, (...) notável é o modo pelo qual superego trata o ego, (...) torna-se demasiado severo, abusa, humilha e maltrata o seu infortunado ego, ameaçando-o com os mais duros castigos, exprobrando-lhe ações há muito esquecidas, (...) como se tivesse levado todo esse tempo acumulando queixas à espera da doença atual para apresentá-las e condenar, por conta delas, o ego. (...) (250)

104 Nosso sentimento da culpa é o resultado da tensão entre o ego e o superego. A consciência, (...) é qualquer coisa que nos é interior, mas que não existia em nós desde o começo. Nesse sentido ela é o oposto da sexualidade, que está, certamente, presente, desde os primórdios da vida, (...) as crianças são, notoriamente, amorais. (...)

105 A influência dos pais domina a criança, dando-lhe provas de afeto e ameaçando-a de punição, diminuição de amor. (...)

106 Essa angústia objetiva é precursora da angústia moral posterior.

107 O superego, que, (...) substituiu os pais, parece ter feito uma seleção parcial e ter escolhido apenas o rigor e a severidade dos pais, as suas funções preventivas e punitivas, enquanto seu amor foi desprezado. (...)

108 Mudança da função paterna para o superego. (...) A base do processo é o que chamamos uma identificação, (...) um ego se tornou igual a um outro, (...) ele imita-o e, por assim dizer, incorpora-o em si mesmo. (...) A identificação, (...) não deve ser confundida com a escolha do objeto, (...) quando um menino se identifica com seu pai, ele deseja ser como seu pai. (pág. 252) (...)

109 A instauração do superego pode ser descrita como um exemplo bem sucedido de identificação com a função paterna. (...)

110 O superego também substitui a influência de pessoas que tomaram o lugar de pais, (...) pessoas que tiveram relação com a educação da criança, e a quem esta considerava como modelos ideais. (...) (pág. 253 e 254) (...)

111 O superego torna-se cada vez mais afastado dos pais verdadeiros, tornando-se, por assim dizer, mais impessoal. Outra coisa que não devemos esquecer é que a criança avalia seus pais diferentemente, em diferentes períodos de sua vida. (...)

112 Mais isso apenas afeta o ego, (...) o superego, (...) foi determinado pelas primeiras representações dos pais. (...) Ele se baseia num fato biológico, isto é, a dependência prolongada da criança, dos pais. (...)

113 Em geral, os pais e as autoridades similares seguem os ditames dos seus próprios superegos na educação das crianças. Sejam quais forem as disposições dos seus egos com os seus superegos, na educação da criança eles são severos exigentes. Esqueceram as dificuldades que tiveram na sua própria infância e estão contentes por poderem identificar-se plenamente com seus próprios pais, que, em tempos idos, os sujeitaram a essas severas restrições. O resultado é que o superego infantil realmente não se formou pelo modelo dos pais, mas sim pelo do superego dos mesmos. (pág. 254) (...)

114 Parte de ambos, tanto do próprio ego como do superego, são inconscientes. (...) O ego (incluindo o superego) de nenhuma forma coincide completamente com o consciente, nem o recalcado com o inconsciente. (...)

115 O id é a parte obscura e inacessível da nossa personalidade. (pág. 256) (...) E só pode ser descrita como tudo o que o ego não é. (...) Denominamo-lo um caos, um caldeirão de ferventes excitações. (...) Ele está em contacto com processo somáticos, retirando dele as necessidades instintivas, dando-lhes expressão mental. (...)

116 Esses instintos enchem-no de energia, mas ele não é organizado e nem tem uma vontade uniforme, somente, dispõe de um impulso para obter satisfação às necessidades instintivas, de acordo com o princípio do prazer. As leis da lógica, acima de tudo a lei da contradição, não regulam os processos no id. (...)

117 No id não há nenhum reconhecimento da passagem do tempo. (...) Os impulsos e as impressões dentro do id, são virtualmente imortais. (pág. 257 - 1) (...) O id não conhece os valores, nem o bem nem o mal, nem a moralidade. (...)

118 A parte mais superficial do aparelho mental, que denominamos sistema perceptivo da consciência. (...)

119 É o órgão sensorial de todo o aparelho; é receptivo, além disso, não só para as excitações de fora, como também para as que procedem no interior do espírito. É difícil errar, encarando o ego como a parte do id que foi modificada pela sua proximidade com o mundo exterior. (pág. 258) (...)

120 O ego tomou a si a tarefa de representar o mundo exterior para o id e também a de poupá-lo, (...)

121 Porque o id, almejando cegamente a satisfação dos seus instintos, sem olhar absolutamente para a energia superior das forças exteriores, não poderia, de outro modo, escapar ao aniquilamento. (pág. 258 e 259) (...)

122 O ego, por meio do teste da realidade, tem de eliminar qualquer elemento nessa imagem do mundo exterior, que provenha das fontes internas de excitação. (...) O ego controla as vias de acesso para a motilidade, (...) destrona o princípio do prazer, e o substitui pelo princípio da realidade. (pág. 259) (...) Sob o ponto-de-vista do dinamismo, ele é fraco: ele toma emprestado a energia do id e não somos inteiramente ignorantes dos métodos, pode-se chamá-los também de subterfúgios, pelos quais retira mais quantidades de energia do id. Entre tais métodos, citamos, por exemplo, o processo da identificação. (...) Identificando-se a si mesmo com o objeto, ele se recomenda ao id no lugar do objeto e procura atrair a libido do id para si mesmo. (...)

123 O provérbio ensina-nos que não se pode servir a dois senhores ao mesmo tempo. O pobre ego ainda tem um papel mais difícil; ele tem que servir a três e deve fazer o máximo para reconciliar as reclamações e exigências de todos os três. Essas exigências são sempre divergentes e frequentemente parecem de todo incompatíveis; não é de admitir que o ego tantas vezes afrouxe em meio da tarefa. Os três tiranos são o mundo exterior, o superego e o id. (pág. 260) (...) O ego se sente cercado por três lados e ameaçado por três espécies de perigos, contra os quais reage mostrando-se ansioso, quando se sente muito oprimido. (...) O superego mantém firmes certas normas de conduta, sem considerar quaisquer dificuldades oriundas do id e do mundo exterior; e, se essas normas não são praticadas, ele castiga o ego com a impressão de tensão interior que se manifesta num sentimento de inferioridade e culpa. (...) Quando o ego é forçado a tomar conhecimento de sua fraqueza, ele tomba na angústia real em face do mundo exterior, na angústia moral em face do superego e na angústia neurótica em face do poder das paixões no id. (...) Incitado, dessa forma, pelo id, cercado pelo superego e repelido pela realidade, o ego luta para reduzir as forças e as influências que trabalham dentro dele e sobre ele na tarefa de obter uma certa harmonia entre as mesmas; e podemos muito bem compreender como é que tantas vezes, nos acontece não podermos reprimir a exclamação: ‘a vida não é fácil’ (261).

124 Certas práticas de misticismo podem produzir alteração das relações normais entre as diversas regiões do espírito, de modo a que, por exemplo, o sistema perceptivo se torna capaz de aprender as relações existentes em camadas mais profundas do ego e no id, que de outra maneira lhe seriam inacessíveis. (...) Os esforços terapêuticos da psicanálise escolheram quase o mesmo método de aproximação. (pág. 263) Seu objeto é fortificar o ego, fazê-lo mais independente do superego, alargar o seu campo de visão e estender, assim, a sua organização para que possa assimilar novas partes do id. Onde estava o id deverá estar o ego. (p.263)

F RENÚNCIA VERSUS SATISFAÇÃO.


125 A satisfação do instinto é sentida pelo ego como prazer. A não satisfação ou renúncia causa desprazer.

126 A renúncia devida a obstáculos externos é penosa. Mas se é devida às exigências do superego traz uma satisfação substitutiva para o ego, que se sente elevado.

127 O superego é o sucessor e representa os pais. (...)

128 O ego está interessado, como se estivesse na infância, a reter o amor de seu mestre e sente apreciação deste como compensação e satisfação; como tormentos de consciência, as suas exprobrações. Quando o ego faz ao superego o sacrifício de renunciar a uma satisfação instintiva, ele espera ser retribuído com mais amor. A consciência de merecer este amor é experimentada como um sentimento de orgulho. (265)

G O ASPECTO INFANTIL E SEXUAL DA NEUROSE.


129 As neuroses só são adquiridas na 1ª infância (pelos 6 anos).

130 Influência paterna, precursora do superego por castigos e proibições facilita a implantação de recalques. Isso é a influência da civilização como causa, determinação das neuroses. Mais fácil para o bárbaro que para o civilizado ter saúde.

131 Longa extensão do período de dependência infantil é causa biológica das neuroses.

132 As excitações patogênicas vêm de instintos da vida sexual. Os sintomas da neurose são ou satisfação substitutiva ou medidas preventivas da satisfação de instintos da vida sexual, que não são de natureza puramente erótica mas incluem componentes do instinto destrutivo.

H UMA DAS DIFICULDADES DA PSICANÁLISE.


133 O narcisismo do indivíduo primitivo o fazia crer na onipotência das suas idéias e por isso cria no poder de influenciar os acontecimentos com magia.

134 O narcisismo universal, o amor da humanidade por ela mesma, sofreu da ciência 3 duros golpes.

135 1°) Copérnico, séc. XVI, golpe cosmológico: a terra (e o homem) não é o centro do universo.

136 2°) Darwin, séc. XIX, golpe biológico. O homem não é melhor que os animais (vide W965p, p.13). Na verdade, é só um animal como os outros (a idéia de superioridade do homem sobre o animal não é inata. A criança como o selvagem, não percebe diferença entre sua natureza e a do animal. O selvagem procura sua ancestralidade e o divino no ancestral zoológico).

137 3°) Freud, séc. XIX, golpe psicológico: o ego não é dono da própria casa. A vida mental tem larga porção inconsciente e a vida dos impulsos sexuais não pode ser inteiramente limitada.

138 O homem se atribui alma imortal e uma origem divina.

139 Por causa do golpe psicológico à sua vaidade o ego tem dificuldade em aceitar a psicanálise.

I A PSICANÁLISE APLICADA À LITERATURA E A RELIGIÃO.


140 Édipo. O destino e o oráculo eram a materialização de uma necessidade interna. O herói peca sem saber ou querer seguindo a natureza inconsciente das suas tendências criminosas.

141 Análise da criação poético–artística. O reino da Imaginação é um santuário construído durante a penosa transição do princípio do prazer para o da realidade. O artista, como o neurótico, sai da realidade insatisfatória e penetra no mundo da imaginação, mas sabe como voltar à realidade. As obras de arte são satisfações imaginárias de desejos inconscientes, tal como os sonhos, mas diferem dos sonhos porque evocam nas outras pessoas, e satisfazem, os mesmos desejos inconscientes neles também. Além disso fornecem um prêmio de estímulo, o prazer perceptivo da beleza formal.

142 A essência dos gracejos consiste em empregar os mesmos métodos da operação do sonho: condensação, transferência, representação de algo pelo seu oposto ou por uma trivialidade.

J PSICOLOGIA DA RELIGIÃO.


143 Notável similaridade entre atos obsessivos e ritual religioso. A neurose obsessiva é religião particular deformada e a religião é uma espécie de neurose universal.

144 Totemismo. 1° sistema de organização das tribos primitivas. O ser venerado é um animal do qual o clã diz descender.

145 Há correspondência entre os 2 principais tabus do totemismo (não matar o totem e não possuir a mulher do mesmo clã) com os 2 elementos do Complexo de Édipo (matar o pai e possuir a mãe). O animal-totem se identifica com o pai.

146 As 1ª fobias por animais mostram que o bicho é substituto do pai.

147 Festa-totem, parte essencial. Uma vez por ano o animal totem é sacrificado e comido, pranteado e festejado.

148 O pai da 1ª horda, déspota, tornou para si as mulheres e expulsou os filhos. Estes se uniram e mataram o pai. Ligaram-se num clã de irmãos e juraram não repetir o crime. A festa-totem é comemoração do feito terrível donde brotou o sentimento de culpa do homem (pecado original).

149 A formação da religião fica no círculo do complexo de pai e baseia-se na ambivalência característica dele.

150 Quando o animal-totem deixou de servir de substituto para o pai primitivo, temido e odiado, venerado e invejado, ele tornou-se protótipo do próprio Deus.

151 No cristianismo a festa-totem se repete na comunhão.

K FRASES


152 ‘Considerando que toda a gente tem uma vida psíquica, toda a gente se considera, por isso, psicólogo nato’ (p. 194).

153 Há uma história de uma velha mulher que oferecia os seus serviços para tomar conta de crianças. Quando lhe perguntaram se entendia de crianças, respondeu o seguinte: Sim, certamente, então não fui também, certa vez, uma criança? (pág.194) (...)

154 ‘No confessionário o pecador conta o que sabe; na análise, porém, espera-se que o neurótico revele muito mais’ (p. 190).

155 ‘A natureza humana ultrapassa muito, quanto ao bem e ao mal, o que o homem acredita a respeito de si mesmo’ (p. 167).

156 ‘Enquanto a filosofia sublime / rege, supremamente, o curso do tempo / o mundo, seguindo o velho costume / se move pela fome e pela paixão’ (Schiller) (p. 201).

157 ‘o discernimento suficiente para perceber quando é oportuno sufocar as paixões, ou quando se deve enfrentar e combater as realidades do mundo exterior é, finalmente, o Alfa e o Ômega da sabedoria prática’ (p. 202-3).

158 A mitologia, assim como o mundo dos contos de fada, só pode ser compreendida na base da vida sexual da criança. (pág. 212) (...)

L DÚVIDAS


159 Recalque não é sinônimo de inibição. (?)


21/04/2013 09:52
ENCYCLOPAEDIA V. 51-0 (11/04/2016, 10h24m.), com 2567 verbetes e 2173 imagens.
INI | ROL | IGC | DSÍ | FDL | NAR | RAO | IRE | GLO | MIT | MET | PHI | PSI | ART | HIS | ???